6.2.07

Sim!

Hoje pendurei um cartaz do SIM por trás da minha secretária. Ao mesmo tempo, o meu colega Pedro passou uma música no computador dele: «No, no, no, no... you don't love me and I know now». Merda, não há coincidências. À medida que os dias de campanha passam, as sondagens, tal como esperava, estão a aproximar as tendências de voto no referendo sobre a legalização do aborto. Tenho algum receio de que se repita o pesadelo de 1998 e a Igreja consiga exercer o seu lobby injusto ao ponto do referendo não passar. Outra vez.

Uma rapariga que conheço, muito activa numa paróquia lisboeta e que vai votar sim no próximo referendo, foi a uma reunião do Conselho Pastoral onde a ordem de trabalhos era, basicamente, a de lançar uma campanha agressiva pelo não. Ela disse que não queria participar, visto ter uma posição discordante. E, subitamente, o assunto excomunhão veio parar à mesa. Sem forças para lutar, a rapariga cedeu e está agora a fazer campanha pelo não. Mas no dia 11 vai votar sim. Isto é uma violência psicológica atroz [e a maior culpada é ela, que se sujeita a isso].

Este fim de semana, no jornal :2, a Cecília Carmo convidou dois correspondentes estrangeiros em Portugal para comentar o referendo sobre a IVG. Uma tipa da Rádio Paris-Lisbonne, muito digna, e um repórter da TVE, muito parvo. Ela tentou fazer uma abordagem jornalística do tema, sem dar opinião e avaliou o peso da Igreja católica como factor decisivo para o avanço do Não. Ele disse que achava impressionante que esta questão se colocasse na Europa em plena século XXI, que demonstrava alguma tacanhez e provincianismo da sociedade portuguesa e que, em Espanha, a questão já não se colocava.

Concordo com a tipa da Paris-Lisbonne. No entanto, não gosto nada de ouvir a sociedade portuguesa ser chamada de provinciana e tacanha por um cidadão espanhol. A comparação com o seu país de origem é típica - a maior parte dos nossos vizinhos revelam-se egocêntricos inchados sempre que analisam um contexto internacional que não compreendem muito bem. Mas, no fundo, assino por baixo o que ele disse. Muito deste Portugal do Não parece-me pequenino e contido, herdeiro de um salarizarismo que era tudo menos laico, temente, crente, obediente ao senhor cura, «pois ele é que sabe dessas coisas, então!»

Hoje pendurei um cartaz do SIM por trás da minha secretária. E convenci a minha mãe a ir votar [a última vez que o fez foi nas segundas presidenciais do Soares] no domingo. O aborto tem de passar e o país tem de ser menos tacanho. Como disse o irritante jornalista espanhol.

4 comentários:

Anónimo disse...

15 QUESTÕES SOBRE O REFERENDO

1 - QUAL A QUESTÃO QUANDO SE FALA DE DESPENALlZACÃO DO ABORTO ?
Em 1984 legalizou-se o aborto em Portugal, mas os prazos dessa lei foram alargados em 1997. Nesse ano tornou-se legal abortar por razões de saúde da mãe até às 12 semanas ou até aos 9 meses no caso de perigo de morte ou grave lesão para esta, até às 24 semanas (6 meses) no caso de deficiência do feto, até às 16 semanas no caso de violação. O referendo de 2007 propõe que a mulher possa abortar até às 10 semanas nos hospitais e em clínicas privadas, com os serviços pagos pelos nossos impostos, sem ter que dar qualquer razão (por não estar satisfeita com o sexo do bebé, por exemplo), e inclusivamente contra vontade do pai da criança. De facto, trata-se duma legalização e liberalização do aborto.

2 - MAS QUEREM QUE AS MULHERES QUE ABORTAM VÃO PARA A CADEIA ?
Uma mãe apanhada a roubar pão para um filho com fome não vai presa, precisa é de ajuda, e lá por isso ninguém diz que o roubo deve ser legalizado e feito com a ajuda da polícia. É importante que as pessoas saibam que o aborto é um mal e por isso é punível por lei, mas as penas têm um objectivo pedagógico (colaboração com instituições de solidariedade social, por ex.), sendo a possibilidade de prisão, tal como no caso do crime de condução sem carta, considerado um último recurso. Há mais de 30 anos que nenhuma mulher vai para a cadeia por ter abortado e a ida a Tribunal (já muito rara) evita-se sem ter que mudar a lei. O importante é ver quantas vidas uma lei salva...

3 - O BEBÉ TEM ALGUMA PROTECCÃO LEGAL ?
A sociedade deve considerar que todos, e especialmente os mais fracos e desprotegidos, merecem protecção legal; mesmo na lei de 1984 este era o princípio base, no qual se abriam algumas excepções. A liberalização do aborto muda esse princípio base, como se a sociedade portuguesa dissesse que há seres humanos com direitos de vida ou de morte sobre outros seres humanos, admitindo que o mais forte imponha a sua vontade ao mais fraco sem que este tenha quem o defenda.

4 - DIZEM QUE O FETO AINDA NÃO É PESSOA E POR ISSO NÃO TEM DIREITOS…
Dentro da mãe não está com certeza um animal ou uma planta, está um ser humano em crescimento com todas as suas caracteristicas em potência desde o momento da concepção. Dependente da mãe, como estará durante muito tempo depois de nascer - pois se deixarmos um bebé no berço sem o alimentarmos ele morre - dependente como muitos doentes ou idosos. Será que por isso estes também não são pessoas, nem têm direitos? É por serem mais frágeis que os bebés, dentro ou fora do seio materno, os doentes e idosos, precisam mais da protecção legal dada por toda a sociedade.
Em 1857 o Supremo Tribunal dos EUA decretou que os escravos legalmente não eram pessoas e portanto estavam privados de protecção constitucional. Queremos fazer o mesmo aos bebés ainda não nascidos?

5 - E OS PROBLEMAS DA MULHER ?...
A suposta solução dos problemas dum ser humano não pode passar pela morte doutro ser humano. Esse é o erro que está na base de todas as guerras e de toda a violência. A mulher em dificuldade precisa de ajuda positiva para a sua situação. A morte do seu filho será um trauma físico e psicológico que em nada resolve os seus problemas de pobreza, desemprego, falta de informação. Para além disso, a proibição protege a mulher que muitas vezes é fortemente pressionada a abortar contra vontade pelo pai da criança e outros familiares, a quem pode responder que recusa fazer algo proibido por lei. Nos estudos que existem, referentes aos países onde o aborto é legal, mais de metade das mulheres que abortaram afirmam que o fizeram obrigadas.

6 - MAS A MULHER NÃO TEM O DIREITO DE USAR LIVREMENTE O SEU CORPO ?
A mulher tem o direito de usar o seu corpo, mas não de dispor do corpo de outro. O bebé não é um apêndice que se quer tirar, é um ser humano único e irrepetível, diferente da mãe e do pai, cujo coração já bate aos 18 dias, com actividade cerebral visível num electroencefalograma desde as 6 semanas, com as características físicas e muitas da personalidade futura presentes desde o momento da concepção.

7 - E QUANTO À QUESTÃO DA SAÚDE DA MULHER QUE ABORTA ?
Legal ou ilegal, o aborto representa sempre um risco e um traumatismo físico e psicológico para a mulher. Muitas vezes o aborto é-lhe apresentado como a solução dos seus problemas, e só tarde demais ela vem a descobrir o erro dessa opção. O aborto por sucção ou operação em clínicas e hospitais legais, pode provocar cancro de mama, esterilidade, tendência para aborto espontâneo, infecções que podem levar à histerectomia, depressões e até suicídios. O aborto químico (comprimidos), cujos efeitos sobre a mulher são em grande parte desconhecidos, quadruplica o risco da mulher vir a fazer um aborto cirúrgico. O trauma pós-aborto deixa múltiplas sequelas psicológicas durante anos.

8 - E QUANDO A MULHER NÃO TEM CONDIÇÕES ECONÓMICAS PARA CRIAR UM FILHO ?
Quem somos nós para decidir quem deve viver ou morrer? Para decidir quem será ou não feliz por causa das condições no momento do nascimento? O destino de cada um é uma surpresa, basta ver quantas estrelas milionárias do futebol vieram de bairros de lata. Deviam ter sido abortadas? Uma mãe com dificuldades precisa de ajuda para criar os seus filhos, abortar mantê-la-á na pobreza e na ignorância, o que só leva ao aborto repetido.

9 - MAS TEM QUE SE ACABAR COM O ABORTO CLANDESTINO...
, E verdade, temos mesmo é que acabar com o aborto, que ninguém pense que precisa dele, mas a despenalização não ajuda em nada à sua abolição. Em todos os países, após a despenalização aumentou muito o aborto legal (segundo a Eurostat, no Reino Unido 733%, por ex.), mas não diminuiu o aborto clandestino, pois a lei não combate as suas causas (quem quer esconder a sua gravidez não a quer revelar no hospital, por exemplo). E após os prazos legais regressa tudo à clandestinidade. A diminuição do aborto passa por medidas reais e positivas de combate às suas causas, e não há melhor forma de ajudar os governos a demitirem-se destas prioridades do que despenalizar o aborto. O que importa é ajudar a ver as situações pelo lado positivo e da solidariedade, e não deixar que muitas mulheres se vejam desesperadamente sós em momentos extremamente difíceis das suas vidas. É preciso que elas saibam que há sempre uma saída que não passa pela morte de ninguém, e que há muitas instituições e pessoas de braços abertos para as ajudarem, como as muitas dezenas delas que têm vindo a ser criadas ao longo do país e com o apoio dos vários movimentos “pela vida”.

10 –A DESPENALlZACÃO SERIA SÓ PARA AS MULHERES ?
Não. A despenalização abrange todos: médicos, pessoas com fortes interesses económicos nesta prática, pessoas que induzem ao aborto Pessoas que na lei de 1984/97 tinham penas muito mais pesadas que a
própria mulher. As leis pró-aborto abrem as portas ao grande negócio das Clínicas Privadas Abortivas e aos acordos para o Estado pagar esses serviços, enquanto os verdadeiros doentes esperam anos para serem atendidos sem terem direito a essas regalias.

11 - MAS A DESPENALlZACÃO NÃO OBRIGA NINGUÉM A ABORTAR...
Está provado que a despenalização torna o aborto mais aceitável na mentalidade geral, e por isso mesmo leva na prática ao aumento do número de abortos. A lei não só reflecte as convicções duma sociedade como também forma essa mesma sociedade. O que é legal passa subtilmente a ser considerado legítimo, quando são duas coisas muito diferentes.

12 - PORQUE SE PROPÕEM PRAZOS PARA O ABORTO LEGAL ?
Não há nenhuma razão científica, ética, ou mesmo lógica para qualquer prazo. Ou o bebé é um ser humano e tem sempre direito à vida, ou é considerado uma coisa que faz parte do corpo da mãe e sobre o qual esta tem sempre todos os direitos de propriedade. Os próprios defensores da despenalização sabem que o aborto em si mesmo é um mal e que a lei tem uma função dissuasora necessária, por isso mesmo não pedem a despenalização até aos nove meses. No entanto, é de perguntar porque é que até às 10 semanas mulheres e médicos não fazem mal nenhum, e às 10 semanas e um dia passam a ser todos criminosos.

13 - SEGUNDO A LEI O PAI DA CRIANÇA TEM ALGUM DIREITO OU DEVER NESTA DECISÃO ?
Não, o homem fica sem nenhuma responsabilidade, e também sem nenhum direito. A mulher pode abortar o filho dum homem contra a vontade dele. Quando a mulher decide ter a criança a lei exige que o pai, mesmo contra vontade, lhe dê o nome, pensão de alimentos e até acompanhamento pessoal, mas se decide não o ter o pai não pode impedir o aborto - fica excluído na decisão de vida ou de morte do seu próprio filho.

14 - O ABORTO É UM PROBLEMA RELIGIOSO, OU ABRANGE OS DIREITOS DO HOMEM ?
O aborto ataca os Direitos do Homem. O direito à Vida é a base de todos os outros. O direito de opção, o direito ao uso livre do corpo, o direito de expressão... todos os direitos de que usufruímos, só os temos porque estamos vivos, porque nos permitiram e permitem viver. Ao tirarmos a vida às nossas crianças estamos também a roubar-lhes todos os outros direitos. A Declaração dos Direitos do Homem explicita que estes são universais, ou seja, são para todos. Porque é que alguns bebés, só porque não são planeados, devem ser excluídos dos direitos de toda a humanidade?

15 - SER CONTRA A DESPENALlZACÃO NÃO É SER INTOLERANTE E RADICAL ?
Não, o aborto é que é totalmente intolerante e radical para com a criança, porque a destrói; não lhe dá quaisquer direitos, não lhe dá opção nenhuma. O "Sim" ao aborto tem em conta a posição dum só dos intervenientes, a mulher, pensando erradamente que a ajuda. O "Não" ao aborto obriga-nos a todos, individualmente e como sociedade, a ter em consideração os dois intervenientes. Ao bebé temos de proteger e de permitir viver. À mãe temos de ajudar para que possa criar o seu filho com amor e condições dignas ou para que o possa entregar a quem o faça por ela, através de adopção.

pinky disse...

vai passar! muita coisa mudou desde ´98, muito indecisos já têem opinião, muitos dos que não votaram vão votar e muita gente nova que não podia votar na altura vai poder exercer o seu direito de voto.
claro que a igreija ainda tem peso na sociedade portuguesa, mas cada vez as pessoas pensam mais pela sua própria cabeça e cada vez importam menos as directizes da igreija, tens essa prova na opção da tua amiga.
triste é a chantagem que a igreija faz com as pessoas, triste é constatar da aplicação de métodos utilizados na idade média para obrigarem as pessoas a certas atitudes, triste é constatar os medos da igreja.
mas o sim há-de vencer, basta de se tapar o sol com a peneira!

p.s. mais triste é que quem defende o não se esconda atrás do anonimato...afinal estamos numa democracia e todos temos direito a uma opinião, e a ser respeitados por isso não vejo razões para as pessoas se exprimirem no anonimato, mas enfim...cada um sabe de si!

Ana Paulo Santos disse...

lobby injusto? ai, Ricky, tanto havia para dizer sobre o assunto... aida não tive tempo para escrever algo que expresse tudo o que penso, mas lá estará no meu blog antes de domingo. seja como for, só uma coisita: a igreja chama a atenção para o dom da vida, em todas as ocasiões. às vezes (muitas vezes) as pessoas não estão disponíveis para ouvir tudo e acabam por limitar a visão da igreja sobre temas como o amor, a relação sexual ou a vida a dois ou três chavões que já estão ultrapassados há muito na igreja a que pertenço e onde me envolvo todos os dias. claro que há situações, ainda hoje em dia, com as quais não me identifico, assim como haverá de certeza casos dos quais não te orgulhas em movimentos do sim, de extrapolações que sempre se fazem quando se debatem temas que mexem connosco. mas a igreja, como qualquer movimento, é feita de pessoas, e nós sabemos como há tanta variedade de pessoas e de formas de dizer as coisas, verdade?
desafio-te e a quem estiver disposto a isso a ler com olhos de ver, ouvir com os ouvidos abertos e sem preconceitos anteriores, tudo o que jé tem sido tão aprofundado na igreja sobre estes assuntos. talvez te surpreendas com as palavras de João Paulo II sobre a sexualidade logo no início do seu pontificado quando ninguém ainda falava sobre isso, ou a visão do amor de Bento XVI na sua última incíclica. Talvez te surpreendas.

Falei sobre a igreja porque também falaste sobre ela. Mas mesmo que igreja tivesse uma posição completamente diferente, eu pessoalmente continuaria a debater-me por um país com medidas positivas para lutar pela vida.

No fundo, acho que o que interessa é estarmos esclarecidos e conscientes daquilo que vamos votar.

Beijo.

Telescópio disse...

Concordo contigo, Pinky. Alguém que é a favor do não deixar aqui a sua opinião anónima está a cumprir um gesto cobarde. Respeito a opinião de toda a gente, mas mais as opiniões pessoais do que um panfleto extenso despejado em copy-paste. Por isso é que tive dúvidas em apagar ou não o primeiro comentário a este post. Mas respeitem-se todas as visões [até as cobardes].

Lua, a tua opinião é madura e legítima. Não concordo com ela porque acredito na visão científica da coisa: um feto é uma vida em potência mas ainda não é uma vida [nunca sobreviveria sem um útero, antes das dez semanas, ainda não está formado e não se consegue desenvolver per si]. E não acho tolerável que se discriminem, prendam, enxovalhem na praça pública mulheres que são obrigadas a fazer um aborto.

Se eu engravidasse uma mulher amanhã, assumiria as minhas responsabilidades. Mas sabemos que há pessoas sem condições para o fazer e, para mim, deve haver liberdade de escolha neste assunto. Não se deve obrigar uma mulher a ter um filho que não quer, nem que depois o entregue para adopção. É uma questão de consciência individual e eu acredito no livre arbítrio.

Por isso é que, na minha opinião, o Não é intolerante e o Sim é tolerante. Forçar a proibição do aborto é obrigar os outros a pensar como nós. E, no que toca à posição da Igreja, parece-me tão criminoso quanto o Papa ir a Moçambique - o terceiro país do mundo com maior taxa de incidência de Sida - condenar o uso do preservativo.