5.12.07

Sobre a bruma


1.
Dou por mim a atravessar a praça da Figueira e percebo que não se vê o outro lado da rua. Sumiu toda a gente, a puta anã, as colegas desta, os polícias da ronda, os taxistas que costumam adormecer na praça. Há um silêncio esmagador em Lisboa desde que esta névoa fenomenal se abateu sobre a cidade. Metrópole sem contornos, desfocada, vazia de gente e repleta de vultos. Dou por mim a pensar que isto não é nada de novo. Uso óculos, caramba. Sem eles, Lisboa é névoa constante.

2.
A minha janela na América oferece moldura sobre urbanidade em frente, grande arquitectura à esquerda, desafogo verde à direita, rio atrás. Mas hoje subi arranha-céus acima e tudo o que vi na pintura foi bruma branca. Ahh... Estou nas nuvens.

3.
Quando estava em Maputo, senti exactamente isto. Também em Londres, uma noite há uns anos. E em Sintra, este fim de semana. A realidade, exterior a nós, prega partidas e obriga a fazer testes. Agora estás sem luz em Moçambique, porque houve um apagão. Sem chapéu de chuva em noite de copioso dilúvio londrino, sem casaco no monte da Lua. Sem ver um palmo à frente do nariz nesta cidade encantada. Avanças e superas-te? Ou escondes-te e resguardas-te?

4.
Venda-me os olhos. Dá-me a mão. Anda.

5.
Como foi acontecer isto? Perdi-me na névoa [terei sido engolido?], deixei de saber onde estava, mergulhei de uma vez por todas na cal etérea das nuvens. Outono em Lisboa, que maravilha. Três da manhã, bem bom. Não vejo nada. E no entanto sinto tudo.

2 comentários:

helena disse...

FUCK!!!!!

helena disse...

MUITO BOM!!!!