30.1.07

Taxi Driver

Ainda que me tenha proposto todos os fins de noite que passei no Porto a ir visitar a Casa da Música na manhã seguinte, a verdade é que só observei a estrutura a partir do exterior e nunca consegui pôr um pé lá dentro. Voltarei a 25 de Fevereiro, propositadamente para ver um concerto do McCoy, pianista do Coltrane, e chegarei mais cedo para analisar a arquitectura interior [espero que a Paulinha possa vir comigo ajudar-me a desconstruir os pormenores do edifício].

Regresso a Lisboa e noto logo que aqui em baixo está mais frio. Ou então são as saudades de juntar o quintento maravilha. Eu, o Jordi, a Helena, o Miguel e a Paula quase formámos na Invicta um daqueles grupos de amigos da adolescência que todos os dias vão beber café às nove e meia da noite, só que no nosso caso o encontro era tardio, invariavelmente no Passos Manuel [brilhante bar, onda musical muito parecida ao Incógnito, mas com melhor pinta e sem o D'Artagnan à porta], e faço o destaque a um grande evento que lá se passou este sábado - a Festa Oportunista da Matéria Prima - esquizo qb, com Cure, Smiths e muito eighties em som de fundo, mais uns passos de dança e um barril de cerveja, pelo menos, para cada um.

Quando se conhecem alguns bons portuenses, o Porto pode ser uma experiência fantástica. Não é cidade melosa e envergonhada como Lisboa, embalo feminino, de voz doce mas prudente. É antes rude, com doses idênticas de agressividade e sinceridade, urbe masculina, tão dura quanto acolhedora, é próxima das pessoas, mostra-se em vez de se esconder.

Na quinta passada, quando apanhámos um táxi para a esquina da rua Formosa com a Sá da Bandeira, pedi ao condutor para subir a partir da Praça D. João I porque a rua Passos Manuel estava em obras. Ele pareceu ficar perplexo por um tipo com sotaque lisboeta conhecer a Invicta, o detalhe de uma calçada esburacada, o sentido oportunista do trânsito, da matéria prima. «Bocês son de Lisboua, num son?» Somos sim senhor, não dá para disfarçar. Mas ele gostou que conhecessemos o Porto, falou da família e dos netos, que a mais velha, que tem doze, anda cheia de ciúmes da «canalha de três e quatro anos», que se o Pinto da Costa tiver de ser preso «paciência, o que é preciso é seriedade», mas depois isto parece-lhe uma cabala dos morcões do Sul, «mas sem ofensa. É do Benfica?» Sou. «Eu do Porto, isto é preciso é haver respeito, ou num é?»

E hoje meto-me num táxi para vir à redacção e compreendo de imediato o contraste da história das cidades. O condutor não soltou uma palavra, nem mesmo quando lhe desejei uma boa semana. Estava a fumar cachimbo e, no semáforo do Areeiro, que nem um minuto faz parar o trânsito, abriu um livro de Balzac e pôs-se a lê-lo, ansioso, em ritmo devorador. No leitor de CD's uma sinfonia de Schubert - penso que a número sete, tal a onda dramática - e nem um sorriso no olhar de hábitos intelectuais.

Percebo de imediato que Lisboa é europeia e civilizada, enquanto o Porto é mais provinciano e efusivo. E nisto, dou por mim a olhar para o calendário. A contar os dias para voltar ao Norte.

26.1.07

PKP*

Há uns meses, numa tarde de calor na esplanada do Princípe Real, a Sandra ensaiou um alucínio de génio: ir do Cairo ao Cabo em karaoke. Pegar numa carrinha, enfeitá-la com pinturas de estrelas da música e do cinema, mais umas letras bem berrantes a anunciar o circo cantante, e assim financiar um corte vertical pelo continente africano. Pode ser que funcione, mas é projecto a longo prazo.

Ontem, no Porto, primeiro ensaio. Uma das protagonistas do trabalho que me fez rumar a Norte convidou-nos para um copo. Pensava que íamos a uma das mecas da cidade [o Maus Hábitos, que me foi apresentado pela Paulinha em Novembro, é um must. O Bazaar significa quatro pisos de festa, onda chill out. O Triplex, mais afastado do rio, serve para os dias de soltar conversa], mas afinal o destino era Gaia, um local chamado Vice-Versa, onde decorria a primeira semi-final do sexto concurso de Karaoke da Invicta.

Miraculosamente, encontrámos uma mesa e pedimos imperiais [«finos, carago»]. Estava eu, o Jordi, o Alberto e a Elisabete, que decidiu ir cantar Sara Tavares quando acabou a grande competição. Eu descobri perdido no meio da lista de possibilidades o «Friday I'm Inlove», dos Cure, e decidi subir ao palco. Excelente opção, porque o animador da festa não ligou peva à minha [falta de] qualidade musical e, como adorava a música, ofereceu uma rodada para a nossa mesa. Acho que o Jordi passar a música de braços levantados a gritar «Ricky, Ricky» também ajudou.

No fim da cantoria ofereceu-me um diploma e fez o anúncio oficial: sou karaokista certificado, tenham muito medo. Depois a Elisabete escreveu um poema liiiiiindo no papel - «Acredita em ti e se isso não for suficiente para alguém, então esse alguém não é suficiente para ti!» O Berto deu-me os parabéns, o Jordi esquizofrenou uma dedicatória e ainda apareceu uma tal de Clara que escreveu «Estiveste bem, continua!».

Acho que o próximo passo é África. Do Cairo ao Cabo em karaoke, estou pronto!


PKP* Porto Karaoke Party

23.1.07

Os suspeitos do costume


Agora o Porto, eu e o Jordi, equipa maravilha. À primeira reportagem que fizemos, fomos logo ameaçados com uma pistola ucraniana. À segunda, o purgatório e o paraíso de encontrar um bom ângulo [e a recompensa de publicar a história em França]. A terceira deu livro, a quarta deu prémio, a quinta deu para encontrarmos cavalos selvagens no meio da Galiza e conhecer a inenarrável recepcionista de um inenarrável hotel com escadarias de mármore, neons verdes e paredes cor-de-rosa. Alucínio constante, em cânone desafinado.

Agora o Porto, eu e o Jordi, equipa maravilha. Encontrar histórias em Marraquexe, perdê-las em Ouarzazate, subir a Avenida Florida em Buenos Aires - num fim de noite que marcava três da tarde, com garrafa de vinho e canecas compradas na rua, para a ocasião, voltar do Gerês e aterrar numa festa alucinada no terceiro andar da rua da Barroca, jantar esparguete com atum pelo menos uma vez por semana [uma em cada duas que vou jantar com o catalão], discutir o aborto no 40 e 1, conhecer duas queques no Lux e dizer-lhes que não podiam morar naquele prédio do Siza, então se tinham ar de Curraleira...

Agora o Porto, eu e o Jordi, equipa maravilha. O ritual é sempre o mesmo: viagem em angústia para encontrar uma boa abordagem, uns copos, reportagem, reportagem, reportagem, jantar, conversa de vida profunda, mais reportagem, discussão, «desculpa», «não, eu é que peçoo desculpa», reportagem outra vez, insanidade mental em barda, sempre bons trabalhos. Sair de Lisboa atrasado, excepto agora o Porto, eu e o Jordi, equipa maravilha, porque viemos de comboio e esse não dá para «ir lá só a casa fazer a mala, puto».

Agora no Porto, trabalho é, como sempre, simétrica obsessão para mim e para o catalão despenteado. Sofre-se e supera-se e ambos sabemos que havemos de voltar com a inevitável relíquia de ter encontrado uma bela história. A dificuldade de trabalhar com os amigos é puro mito. Siga a festa.

18.1.07

Prócima Estación: Esperanza

Tínhamos combinado café na Fnac, depois mudámos os planos para a Galeria K, mas ao fim da tarde acabámos no Ágito. Cenário com the famous five - Sophy, Sandra, Jordi, eu e uma botella de Quinta de Cabriz - para matar saudades e combinar revoluções. Depois o catalão maluco zarpou, a Sandra confessou um atraso e a garrafa esvaziou-se. Fiquei eu e a Sophy. «Vamos jantar?»

Ambrósio apetecia-me algo, disse ela, e percebi logo que os tascos do costume não seriam a nossa praia. Sugeri o Buenos Aires, mas a dama contra-argumentou bem: «Abriu um restaurante novo muito cool, tentei ir lá ontem e não havia mesas. Queres tentar?» Quero. Descemos até à rua do Norte e havia mesa para dois no Esperança. Queres comer o quê? Uma garrafa de Malbec, tenho saudades da Argentina.

Espaço intimista, bom atendimento, melhor comida. Gostei do Esperança, está nitdamente on the beat. Deambulámos histórias de reportagens e desamores, pelo meio de esparguete negro e da calzone. Acabou o vinho. Imperial no clube da esquina? Vamos lá. E passamos pelo Beto, claro, temos que lhe ir dar um abraço.

No momento em que entrámos no Calcutá já a sobriedade nos tinha abandonado há muito. Queres uma imperial, perguntei. Não, eu bebo da tua, e a Sophy a agarrar num talher para beber cerveja à colherada. O restaurante estava em obras, o lava loiça no meio da sala dos comensais, a dama a fingir-se de lavadeira. Depois trazem-nos um I-Pod com sonoridade indiana e oiço o comentário feliz da rapariga: «Uau! Música para aumentar a população!» Saímos umas quantas imperiais depois, vá lá que não fomos ao Oslo como de costume, para a Sophy dançar o Dancing Queen e meter conversa com senhoras de vida fácil. Zonzo, levei-a ao táxi e fiquei por momentos na rua com uma obsessão na cabeça:

Porque raio é que eu não tenho amigos normais?

16.1.07

O Marítimo da Bica

Quando arrancou o Campeonato do Mundo de Futebol, Lisboa andava em agitado rebuliço a preparar-se para o Santo António. Vi os primeiros jogos da Selecção no «Quintal da Copa» – que o Hugo e o João instalaram na Penha de França – mas depois o primeiro rumou para o Brasil, o outro para Idanha-a-Nova, e eu acabei por combinar com o Ric [meu companheiro de andanças futebolísticas, entre muitíssimas outras andanças] vermos os jogos que sobravam na Bica, um dos bairros típicos da capital. A Cátia vinha ter connosco mais tarde.

Descemos a calçada – que se chama Duarte Belo – no dia combinado. Passámos o Bicaense, o restaurante africano, o Grupo Excursionista Vai Tu e virámos à esquerda. Descemos as escadinhas e lá estava o Marítimo da Bica, janelas e portas escancaradas, mesas compridas montadas na rua, mais o televisor elevado numa frágil estrutura de mesas e cadeiras. A marcha de 2006 ressoava num improvisado sistema sonoro, ao passo que os marchantes se aproximavam e grelhavam febras e pregos ao ar livre. «Sentem-se, sentem-se.» É aqui que ficamos, não haja dúvidas.

Portugal-Holanda foi um sofrimento. Na rua e de olhos postos na televisão, os organizadores da marcha, concentrados no Marítimo, gritavam mais alto do que nós. A meio da primeira parte sentaram-se dois franceses na nossa mesa - o Vincent e a Anais - com quem íamos partilhando cerveja e bifanas. O senhor Américo e o senhor João já nos tratavam por filhos, ofereciam-nos cerveja «para dar sorte» e a bebedeira ia crescendo. A táctica, pelos vistos, funcionou, já que ganhámos e a trupe entrou em delírio. Música em altos berros, eu agarrado às velhas a dançar música pimba, mais a marcha da Bica, e a promessa de voltar para o jogo com Inglaterra. O Vincent e a Anais, que iam para Coimbra e Porto, cortaram-se ao regresso.

Meia semana depois, jogo com Beckham e companhia, desta vez aparecemos mais cedo e, como o desafio correu durante a tarde, ficámos dentro do edifício. Já toda a gente nos tratava pelo nome, já tínhamos mesa reservada no meio da tropa da Bica. Eu, o Ric e a Cátia, acompanhados pelo Torcato, com quem vemos sempre a bola, a Bego, minha ex-namorada espanhola, e o Juvenal, colega de trabalho que é natural do bairro e se juntou à festa. Novamente muita música, muita cerveja e a certeza de já fazermos parte da casa. A meio da primeira parte, voltaram a aparecer os franceses - tinham desviado a rota para vir ali. Família espontânea, em reunião animada. Muita cerveja, ameaças de ataques cardíacos, e ganhámos nos penalties.

Ao terceiro jogo já andávamos a montar os toldos cá fora e a comer o jantar dos marchantes. Cerveja paga era coisa pouca, beijinhos das velhas e abraços dos homens era coisa farta. Perdemos com a França mas ganhámos amigos. O Vincent e a Anais mandaram sms de Paris, mails com fotos, prometeram voltar no próximo Verão.

Ontem voltámos ao Marítimo da Bica – eu, o Ric, o Torcato e o Juvenal – para vermos o Benfica ganhar à Académica dois a zero. O ritual repetido, como se fossemos naturais do bairro. Gritaria constante, beijinhos e abraços, «há tanto tempo que não apareciam». Voltaremos mais vezes, de ora em diante.

Não vivo na Bica mas, pelos vistos, sou natural dali.


PS: Outro benfiquista ferrenho com quem não vou ver a bola há imenso tempo é o Phil, que abriu um blog novo e merece uma visita atenta. Passem lá por http://www.aruexperienced.blogspot.com/

15.1.07

O alfarrabista de Roma

Na esquina da avenida de Roma com a América há um quiosque que não vende jornais, nem tabaco, e que [des]ilude todos os que querem comprar o Público ao domingo de manhã. É, como habitual, um cubículo onde mal cabe uma pessoa, com uma mesa por diante e dois expositores laterais. Mas, em vez dos papéis da actualidade, ali vendem-se livros que foram escritos numa altura em que não se podia livremente dar asas à imaginação. Nem à opinião.

O alfarrabista de Roma não parece português. É alto e magro, olhos claros escondidos numa barba mal aparada, roupagem desmazelada e discurso parco. É como se o homem não estivesse realmente interessado em vender os seus livros, antes manifesta o desejo de expô-los para o mundo os conhecer. Não é raro vê-lo discursar sobre a importância do «Portugal e o Futuro», de Spínola, ou defender o regalo que é ter uma primeira edição de «A Fogueira das Vaidades», do Tom Wolfe, e depois hesitar em vender qualquer uma das obras a qualquer comprador que não mostre um entusiasmo no mínimo tão grande quanto o seu. Eis um sofista, em pleno século XXI, na esquina de Roma com a América.

Domingo de manhã [ok, ok, era de tarde] subi a América para comprar o Público e detive-me por instantes diante do quiosque das papeladas antigas. Olhei de relance para um volume da Academia Geográfica de Lisboa, um ensaio cartográfico da capital que por certo não me importaria de ter. Não me interessei pela biografia de El Rey D. Carlos, menos ainda pela proibida [como são todas] edição do «Mein Kampf», de Adolf Hitler. E, subitamente, aterro os olhos no «Eléctrico», de José Gomes Ferreira, primeira edição a dois euros. Pego no livro e o alfarrabista repara: «Ah, José Gomes Ferreira! O grande poeta esquecido. Sabe que ele morreu de felicidade pouco depois do 25 de Abril?» Contesto: «Não foi ataque cardíaco? Ou fígado? Diz-se que ele bebia muito.» Respondeu-me que os poetas bebem todos muito, é defeito de fabrico para quem analisa a magia do mundo, e que foi seguramente de alegria que o seu corpo sucumbiu. «Afinal, ele sempre foi um opositor ao regime.» É verdade.

Há anos, subia as escadinhas do Duque e entrei noutro alfarrabista onde encontrei uma primeira edição do José Gomes Ferreira, assinada e datada por um antigo proprietário. Coincidência ou destino, o livro tinha rubricada a data do meu nascimento, o que encarei como um óbvio sinal de obrigatoriedade em adquiri-lo. Tinha 15 anos e apaixonei-me pela escrita flutuada do poeta, o grande esquecido José Gomes Ferreira, que fica na história com o nome de uma rua e uma escola em Benfica. É sem dúvida pouco para tanto talento.

E este domingo de manhã [de tarde], quando ia comprar o Público, encontrei-o novamente num alfarrabista, desta vez sem data nem coincidências fatais, mas com idêntico sinal de que o teria de levar. Contei ao alfarrabista a minha história de há meia vida, ele sorriu e depositou-o nas minhas mãos. «Este ofereço eu», disse. Já não comprei o Público e enfiei-me o dia todo em casa em delírio poético.

O alfarrabista de Roma pode não ter grande jeito para o negócio, mas é sem dúvida genial no que toca à leitura das almas. Honra a ele.

11.1.07

Cheira a Lisboa

O primeiro camião de recolha do lixo passa invariavelmente pela rua da Atalaia por volta da meia-noite, quando o Bairro Alto começa a ficar cheio de gente. À uma e pouco passa uma segunda carrinha, com idênticos objectivos. Em sentido ascendente, o primeiro motorista trava em frente ao Calcutá e, segundos depois, em frente ao Spot. O segundo estaciona em frente ao 21 e lá segue o seu caminho [desce a rua da Barroca e pára diante do clube da esquina, para recolher os sacos e caixotes]. Ou seja, na precisa hora em que a multidão se acotovela, os funcionários da Câmara Municipal de Lisboa ocupam a rua e impregnam o ar com o seu doce aroma de quatro rodas. Poderiam passar antes das onze, mas atravessar o deserto das ruas não teria se calhar tanta piada, nem incomodaria tanta gente. À meia-noite é que é. E novamente à uma. Crazyyyyyy!

Já que é da recolha de lixo que se trata, a inquietação prossegue. A maior parte dos caixotes do lixo do Bairro Alto estão, por incrível quer pareça, trancados à chave. Como se os despojos fossem uma exclusividade do dia nos principais quarteirões da vida nocturna da capital. É [mais] um traço de esquizofrenia nesta cidade. É favor deitar os copos de plástico para a rua.

Gosto de passear pelo Bairro de dia e gosto da pacatez quinhentista das suas ruas. Até gosto dos grafitti nas paredes, porra. Mas não suporto o cheio do camião, nem os caixotes de lixo trancados, e muito menos dos cartazes que pedem silêncio para os moradores na rua do Diário de Notícias. Se é a sua vocação nocturna que torna o bairro em Bairro, então assuma-se a tendência. Caixotes do lixo para todos, camiões de recolha pela manhã e faça-se barulho a horas impróprias. Tenho dito.

9.1.07

Resquícios de ano novo

Eu já devia saber que ir jantar à segunda-feira com o Jordi ia acabar assim. Mensagem no telemóvel, «mano vamos jantar fora, vá lá.» está bem, vamos, oito e meia na Fnac e depois vamos ao Calcutá, que é preciso mudar de hemisfério de quando em vez. Oito e quarenta chego eu, dez para as nove aparece o catalão maluco.

Ainda não pedimos a imperial da praxe quando encontramos a Adriana repleta de sacos e novidades: «Há mamas de silicone em promoção na woman's secret.» Fantástico. Entretanto o Tiago combina vir ter connosco à meia noite, para beber uns copos. Teme-se o pior, mas siga.

Dez da noite, engano-me no molho e encho uma chamuça de picante. Água, vinho, uma garrafa, é melhor pedir a segunda. «Maninho, vou apanhar o último metro.» Vais, vais.

Meia noite, imperial no 40 e 1 e o Tiago com o cabelo rapado. Mais três, Sandra, se faz favor. Discussão sobre a legalização do aborto bem regada e o argumento de que os duendes do pai natal são tentativas de aborto frustradas não pega. Mais três e«shit, perdi o último metro.»

Tenho duas casas nas redondezas [aliás, com sorte até tenho mais, porque a Lena e a Sophy vivem no Príncipe Real e não negariam tecto a este sem-abrigo, estou certo, caso fosse necessário], a do Jordi e a do Tiago. O catalão tem sono, sume-se. Ficamos eu e o homem sem caracóis, mais umas quantas imperiais e decido ir dormir à Baixa.

Subo os 112 degraus do quinto andar que parece sexto. Chego afogueado, mais umas cervejas, é melhor e «põe aí som, puto». Bob Marley, Lou Reed, Marvin Gaye, Lisa Ekdahl.

Quatro da manhã. De lata de cerveja na mão eu e o Tiago abraçados a cantar o High Tide Low Tide, «I'm gonna be your friend», depois ainda abrimos a última lata. Eu com um cachecol enrolado na cabeça, Sandokan como na festa de ano novo, mais uns óculos escuros que a moca traz sensibilidade à luz. Começa uma nova semana de um novo ano, mas os hábitos são os do costume. As segundas serão sempre as noites mais insanas de Lisboa.

8.1.07

Back to America

De volta. Vieram as festas e as férias, excelente combinação. Depois o ano novo, que me deveria ter levado para o Algarve, mas a casa falhou. Mudámos então de planos para Lamego e, no dia em que partimos de viagem, a casa falhou. Seguimos para Aveiro e organizámos cinco dias de fiesta total. Na noite de reveillon as janelas para a cidade, bem no centro da urbe, estavam abertas de par em par com a mitra a dançar no enquadramento. Assim ficámos até às cinco, entre copos e fumos. Depois seguimos para uma festinha trance na Vagueira, até à tarde seguinte. Ainda não recuperei totalmente. Os trinta já pesam, shit.

No regresso a Lisboa, a compensação por ter arrumado a casa antes de partir. Tudo arrumado e limpo, o que é pouco o meu estilo. Soube bem essa sensação. Tal como souberam bem as festas da última semana no meio do cosmopolitanismo da capital. Agora tenho vontade de sair outra vez. Viva 2007!